Nasci nesta cidade que se divide pelas águas de um rio. As águas do Piracicaba, um belíssimo pai agregador que criou uma comunidade de indivíduos ao seu redor e uniu os povos. Quem saiu das células-tronco deste canalizador de almas sabe o quão importante é o seu espírito. Não tem quem passe por pontes, avenidas à beira, voe sobre ele e que não pense no poder e grandiosidade que imperam em seu nome.
O saudosismo que levo comigo é aquele pelo qual não vivi. De quando as águas do Piracicaba eram limpas, os resíduos humanos e industriais não eram injetados sobre ele e assim poderia exercer sua majestade, aglomerando peixes e criaturas na sua natureza selvagem.
No entanto, me sinto um filho ingrato que tranca o pai no asilo, ofende com palavrões sua inexata memória, grita aos berros para o seu entendimento surdo. A verdade é que todos estão surdos, cegos, sem olfato ou ainda sem a lembrança de quando nos livro de estudos sociais se estudava a água como insípida, inodora e transparente.
E eis que então, em discussões e promessas deste ano marcado, só ouvi falar sobre as pontes que o encobrirão, sobre as avenidas que o rodearão, sobre as vidas que melhorarão ao seu redor com saúde, educação, emprego, moradia... Mas dele, alguém se lembra? A obscuridade de suas águas negras e os defuntos que bóiam na sua superfície não ouço, não leio, não entendo!